Se eu pudesse, agarrava-te todos os dias nos meus braços, cantava-te músicas de embalar até fechares os olhos, lia-te histórias e inventava-lhes o fim, deitava-te nos meus braços e esperava que adormecesses, entrava nos teus sonhos e pintava-os de cores e sons perfeitos, depois acordava-te ainda cedo, devagar, pegava nas tuas mãos até acordares, trazia o pequeno almoço à cama. Ficava quieta, à espera que começasses o teu dia ao meu lado. Levava-te para um lugar onde nunca fomos, tu ias de olhos vendados, não sabias nada mas confiavas em tudo, então chegávamos a um canto sossegado, perdido dos homens e do mundo, deitava-te em cima de uma cama, até adormeceres outra vez nos meus braços. E de olhos fechados, podias imaginar a vida que sonhas mas ainda não conheces, podias ver o futuro a passar-te à frente, fazias as pazes com o teu passado e percebias que podemos ter aquilo que sempre quisemos, que nada é impossível. Se eu pudesse, voltava ao princípio e ia mais devagar, falava mais e ouvia-te menos, oferecia-te um dicionário com todas as palavras que não conheces ou já esqueceste, tolerância, confiança, transigência, partilha, construção. Depois embalava-te outra vez nos braços e esperava que o dia seguinte trouxesse atrás de si outro e mais outro e deixava a vida fluir, esquecia-me dos teus defeitos e tu dos meus e com o tempo aprenderíamos a viver um com o outro sem nos cansarmos, sem nos magoarmos, sem sombras... Se eu pudesse... mas não posso.
Falta a tua voz, o teu desejo, o teu querer, o teu poder.